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Os acontecimentos de 11 de setembro de 2001, a recente guerra
no Iraque e anteriores a estes as crescentes disparidades
entre Norte e Sul, cujas conseqüências, como a miséria,
apenas começamos a vislumbrar, reafirmam a urgente necessidade
de conferir às Nações Unidas o papel de instância
suprema que lhe corresponde e que tanto se menospreza no desorientado
panorama atual. As Nações Unidas constituem a única
possibilidade de um marco ético-jurídico em escala mundial.
No lugar de divorciá-las de sua missão e reduzi-las a ações
de ajuda humanitária, deveriam ser reforçadas para que não
só a paz, mas a convivência pacífica em relação
aos demais e ao meio ambiente transforme-se em realidade. Poderiam
assim cumprir a missão fundamental plasmada pelos fundadores no
Preâmbulo da Carta das Nações Unidas: NÓS,
OS POVOS, resolvemos evitar às gerações futuras o
horror da guerra...
Não há dúvida de que, pouco a pouco, o sistema das
Nações Unidas foi debilitado, destinando-lhe funções
de ajuda humanitária e manutenção da paz pós-conflitos,
ao invés de construir a paz através do desenvolvimento endógeno,
da capacidade de cada país de explorar suas próprias riquezas,
começando pelas aptidões e a capacidade criativa de seus
habitantes.
Em conseqüência, um dos deveres mais estimulantes, no início
deste século e milênio, consiste em trazer novamente à
baila, com lucidez e firmeza, as regras da política internacional
do século XXI, com um plano de acordos múltiplos, de tal
modo que os direitos humanos de uma grande parte da Humanidade não
sejam simplesmente enunciados midiáticos. É nas Nações
Unidas que se tornam presentes as bases morais, políticas, sociais,
econômicas e jurídicas de uma verdadeira norma de paz.
Devemos estar conscientes de que a paz e a segurança baseadas na
justiça e na liberdade continuam ausentes e continuamente ameaçadas
no Mundo. Grande parte dos habitantes do planeta sub-vivem em condições
deploráveis de pobreza. E os países prósperos continuam
imersos em um modelo de crescimento econômico que produz fraturas
e assimetrias, e cujo impacto sobre o meio ambiente é tão
desastroso que a qualidade de vida das gerações futuras
está cada vez mais interditado. A perda da diversidade cultural
constitui outra tendência que empobrece, talvez de forma irreversível,
uma das características mais importantes da Humanidade.
Os países mais avançados devem por sua peculiar responsabilidade
em relação à segurança geral de todos os cidadãos
do mundo e a integridade do planeta ajustar rapidamente seus esforços
para novas alianças que permitam aliviar o sofrimento da Humanidade
em seu conjunto e reduzir o impacto dos desastres naturais, incluídos
os provocados por seres humanos.
Muitos destes países subscreveram nos últimos anos belíssimas
declarações, resoluções e compromissos. O
descumprimento destas subscrições tem desembocado em grandes
disparidades de índole econômica e social. Em múltiplas
ocasiões tem-se destacado a contradição, tão
nociva, que representa a existência de democracia que é
a solução em âmbito nacional e de oligarquias
em âmbito internacional.
No mundo em que as fronteiras não podem evitar a passagem dos fluxos
informativos, financeiros, ambientais etc., as instituições
políticas nacionais e supranacionais apoiadas no Estado, progressivamente
debilitado, são insuficientes para resolver os principais problemas
e desafios de alcance planetário. A ausência de regulação
democrática em escala mundial favorece interesses particulares
e alimenta as tendências unilaterais baseadas, sobretudo, na força
militar. Sem regras, a globalização desgovernada
converte-se na principal fonte de instabilidade e transtorno.
É necessário e urgente estabelecer novos contratos de ordem
social, ética, cultural e ecológica com base em princípios
comuns que situem o ser humano acima dos interesses comerciais e econômicos.
Um novo contrato que dê prioridade aos direitos humanos diante da
legislação internacional; que possibilite decididamente
a eliminação da pobreza e garanta um desenvolvimento solidário
mais eqüitativo e reverente à diversidade de gênero,
cultura e meio-ambiente.
Necessita-se de uma reforma em profundidade do sistema de instituições
internacionais, que articule um verdadeiro sistema de governo democrático
global. Partilho com Carlos Fuentes que a globalização
em si mesma não daria seus frutos sem a prevalência do direito,
e que uma globalidade sem regras conduziria a desequilíbrios
perigosos e a injustiças perpetuadas... Se Estado, Nação,
Comunidade Internacional, não se comprometem com a legalidade acima
das forças de mercado e do crime, estas se imporão com a
força da fatalidade invisível...
Existem importantes iniciativas em vista da reforma das Nações
Unidas. Uma delas corresponde ao Fórum Mundial da Sociedade Civil
a Grade de Redes Ubuntu que iniciou uma campanha
mundial para a reforma em profundidade das instituições
internacionais, a fim de que possam responder aos grandes desafios sociais,
econômicos e culturais de nosso tempo, e substitua a presente impunidade
em escala mundial por mecanismos reguladores apropriados. Esta iniciativa
mereceu decidido apoio de pessoas de renome mundial e de prestigiosas
organizações. Seu objetivo é contribuir para estabelecer
um sentido ético na aldeia global e propiciar um grande
plano de desenvolvimento endógeno planetário.
Ubuntu propõe uma reforma que reforce e democratize as Nações
Unidas e ponha as demais instituições multilaterais sob
seu controle, através do desenvolvimento da legislação
internacional amplamente aceita por seu valor e legitimidade democrática
Carta das Nações Unidas, Declaração
Universal dos Direitos Humanos, Pacto Internacional de Direitos Civis
e Políticos, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Sociais, Culturais etc. Institucionalmente, é urgente fortalecer
a Assembléia Geral das Nações Unidas e por sob sua
autoridade todos os órgãos, agências e organizações
multilaterais mundiais (Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional,
Organização Mundial de Comércio etc.).
É primordial dotar o sistema forense internacional dos meios humanos
e financeiros necessários, para assegurar o cumprimento da legislação
internacional.
A reforma do ECOSOC, como Conselho de Seguridade Econômica e Social,
deveria promover o desenvolvimento social e econômico dos países
em desenvolvimento. Do mesmo modo, estabelecer um Conselho de Seguridade
Ecológico e, para garantir um desenvolvimento humano sustentável,
combater as tendências mais insustentáveis ao mesmo tempo
em que se promovam modelos coerentes e respeitosos diante da diversidade
cultural, nossa grande riqueza comum.
Uma reforma que fortaleça a democracia representativa, participativa
e preventiva do sistema de instituições internacionais.
Da mesma maneira que os Estados são insuficientes para governar
a globalização, as instituições
internacionais também o serão se não se incrementam
as possibilidades de participação real dos cidadãos,
tanto na tomada de decisões como na prática das mesmas,
mediante mecanismos de representação direta da cidadania
mundial e de participação da sociedade civil organizada.
O futuro não tem por que ser necessariamente igual ao presente
e ao passado. É-me caro repetir que o fundamental é a
memória do futuro ainda intacto, para que possa escrever-se
com linhas menos tortas, todas as mãos juntas. Memória para
saber que nunca se consegue a integração por interesses
particulares ou financeiros, mas pelo fio condutor da cultura, pelo denso
tecido de distintas fibras. Memória do passado para saber que todas
as transformações nunca foram feitas pela força das
armas, senão pelas forças das idéias, dos ideais.
Ponhamo-nos todos a favor da vida, todos ao lado da paz preventiva.
Ponhamo-nos firmes na paz para reforçar rapidamente as Nações
Unidas, dotando-as dos recursos necessários para estabelecer os
códigos de conduta mundiais necessários para assegurar,
em nome de todos, seu cumprimento e contribuir para tornar possível
a transição de uma cultura da força, imposição
e violência para uma cultura do diálogo, da compreensão
e da paz.
(Tradução: Monte Alverne Queiroz Fraga
Aracati CE)
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